Esguio.
O seu rosto é ossudo, marcado,
Bem desenhado.
O jovem é alto e dinâmico.
É atlético e desportista.
Será tímido, mas ambicioso.
O jovem queria muito ser mais famoso.
O jovem passeou a sua beleza pelos ecrãs.
O jovem queria mostrar ainda mais a sua beleza.
Ser belo é ser merecedor de fama.
O corpo e o rosto vendem-se aos fotógrafos.
O corpo consome-se nos media.
O corpo expõe-se.
A carcaça da vaca na montra do talho.
O corpo belo do jovem na revista.
O corpo embelezado, trabalhado, cinzelado
desfila na passarela.
Todos os olhares se viram para o corpo.
Os do fotógrafo captam os sinais.
Os olhos dos observadores comem o corpo.
Despem-no e comem-no.
Como os olhos da velhinha comem a carne exposta da vaca.
O corpo é um investimento.
Acções.
As acções são compradas pelos accionistas.
As acções rendem.
O corpo é malhado.
O alimento é racionado.
Os ombros largos.
Os bíceps salientes.
O peito musculado.
A cintura perfeita.
A anca estreita.
A coxa forte e ampla.
O jovem irradia sensualidade.
O jovem estimula os sentidos.
O jovem tem olhos profundos e brilhantes.
O jovem é inteligente.
Será bonito por fora e por dentro?!
Sabe o que fazer da sua vida.
O velho era velho.
Já teria sido belo e garboso,
esguio.
Sensual.
Já tivera também 21 anos.
Teria tido amores e desamores.
O velho tornou-se balofo
O velho ficou baixo e redondo,
As gorduras cresceram-lhe para os lados.
O velho era azedo e corrosivo.
O velho era limão muito verde.
O velho era bom para os amigos e viperino para os outros seres humanos.
A sua língua não tinha fim.
O velho era famoso sem razão.
O velho dizia tudo o que queria.
O velho destruía imagens e construía o que lhe apetecia.
O velho era de apetites.
O velho comera o pão que o diabo amassara, mas amassara também muitas vidas.
O velho ainda tinha desejos.
O velho ainda era um ser vivo. Velho mas vivo.
Os velhos apaixonam-se.
Os velhos têm ciúmes.
Os velhos querem tocar a juventude perdida.
Os velhos têm desejos.
Os velhos enganam-se com a sua própria imagem.
Os velhos podem ter dinheiro e comprar a beleza perdida.
Outras vezes pensam que o podem fazer.
O velho acreditou.
O velho confundiu tudo.
O velho só viu o que quis ver.
O velho não compreendeu.
O velho seria esperto, mas cego.
O jovem efebo e o velho balofo encontraram-se.
O que um pediu ao outro não sabemos.
O que um queria é provável que o antecipemos.
O que o outro estava disposto a dar também percebemos.
O jovem garboso estrangulou o velho balofo.
O efebo esmagou o crânio do velho.
O jovem belo, modelar, cinzelado e musculado, esperto e inteligente, tímido e ambicioso perdeu-se.
A sua mente ultrapassou os seus actos.
O jovem brutalizou o velho.
O que fez não quis fazer.
O efebo inutilizou o velho.
O jovem tímido protegeu a sua intimidade.
O jovem espeta um saca-rolhas num olho do velho.
O jovem macho emascula o velho.
O velho esvai-se em sangue.
O velho é uma poça vermelha entre as pernas.
O velho perdeu o desejo.
O velho esqueceu a fantasia.
O velho perdeu um grande amor.
Já não é um homem.
É um cadáver incompleto.
Já não tem afectos.
Já não tem ciúmes.
Já não compra.
Já não corrói.
Já não corrompe.
Já não rezinga.
Já não arrisca.
Já não paga.
Já não expõe.
Já não azeda.
Já não tem culpas.
Já não respira.
O jovem sai.
Garboso, bem vestido.
Jovem psicótico,
Olhar vítreo.
Sai, olhando em frente, olhos vidrados.
Manequim desfilando no átrio do hotel, na direcção da rua.
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